a energia do futuro
A busca por eficiência energética pode levar o Brasil do futuro a ser o Canadá de hoje, graças à sinergia entre os dois países e muitas oportunidades de negócios
Por Maria Emília Farto
País de dimensões continentais, com áreas remotas, amplitude térmica, grande potencial hídrico e mais de 60% da eletricidade gerada por hidrelétricas: essa é uma descrição que se encaixa bem no Brasil — e no Canadá também. Além das semelhanças, os negócios na área de energia hidrelétrica entre Brasil e Canadá vêm do início do século 20, quando a canadense Light foi pioneira na implantação de energia hidrelétrica em São Paulo e Rio de Janeiro, as maiores metrópoles brasileiras da época, criando um círculo virtuoso que, mais de cem anos depois, pode se repetir em versão evoluída, tendo a gestão eficiente de energia como fator determinante.
No Brasil, a busca por eficiência energética começou a acontecer de forma mais intensa no início dos anos 2000, durante a crise do apagão, e se tornou ainda mais premente com a crise hídrica de 2021 — ano da pior seca dos últimos 91 anos, que impactou a geração de energia pelas hidrelétricas e que levou o país a acionar as termelétricas, elevando os custos com reflexos negativos na economia.
Na avaliação de especialistas, além da diversificação da matriz energética, a redução do consumo — que engloba investimentos e ações do governo, do setor privado e da sociedade civil — é uma das formas mais rápidas e indicadas para mitigar o impacto de crises hídricas nas mudanças climáticas.
Na outra ponta do continente, o Canadá, um dos maiores consumidores de energia per capita do mundo, desde o início dos anos 1960 já vem implementando soluções de diversificação de matriz e eficiência energética. Essa decisão levou o país a desenvolver, com bastante competência, soluções que vão de equipamentos, metodologias e dispositivos até sistemas de inteligência artificial, tanto que atualmente é um dos poucos países desenvolvidos que exportam energia elétrica.
Na avaliação de Laura Tarouquela, oficial de desenvolvimento de negócios de energia elétrica do Consulado Geral do Canadá, este é o cenário perfeito para a geração de grandes negócios. “O Brasil oferece muitas oportunidades de investimentos. O Canadá já avançou muito em termos de eficiência energética e pode contribuir com conhecimento, tecnologia e as melhores práticas. Ambos têm muito a ganhar nesse setor”, afirma.
Para os próximos anos, os maiores investimentos no Brasil deverão se concentrar especialmente nas concessionárias de energia, indústria, iluminação pública e prédios públicos. Sinalizando oportunidades, Laura lembra que “as concessionárias de energia no Brasil possuem investimentos obrigatórios em eficiência energética, podendo ser utilizadas tecnologias estrangeiras”.
“Além da diversificação da matriz energética,
a redução do consumo de energia é uma das formas mais rápidas e indicadas para mitigar o impacto de crises hídricas provocadas pelas mudanças climáticas, que tendem a se repetir”
Entre as soluções que as concessionárias brasileiras podem buscar nas empresas canadenses, a diplomata destaca as tecnologias demand side management. Muito utilizadas em vários países, elas permitem às concessionárias controlar a demanda em determinados períodos de pico, oferecendo tarifas diferenciadas.
O suprimento de energia elétrica em áreas remotas, com maior dificuldade de acesso, também é um ponto importante no gerenciamento da eficiência energética, porque nesses locais costuma-se optar por sistemas ou fontes mais caras. Para esses casos, o Canadá oferece microrredes inteligentes que permitem o uso e armazenamento de energias renováveis para utilização quando necessário.
De olho no cenário promissor, algumas empresas canadenses têm aportado com sucesso em terras brasileiras. É o caso da Armstrong Fluid Technology, do setor de gerenciamento da movimentação de fluidos hidrônicos, que tem focado seus negócios principalmente nos sistemas de ar-condicionado central instalados em shopping centers, hospitais e aeroportos.
Hilton Nascimento, general manager da subsidiária brasileira, explica que, nessas edificações, o sistema de climatização responde por aproximadamente 60% do total consumido pelos edifícios. “Qualquer ganho obtido nessas instalações gera uma redução significativa do custo operacional, com retorno do investimento.”
A Armstrong está no Brasil desde 2012 e iniciou as operações de sua unidade fabril em 2015, em Embu das Artes (SP). De acordo com o executivo, a empresa tem apresentado crescimento significativo no volume de negócios ao longo dos últimos seis anos e vem ganhando reconhecimento com alguns projetos premiados.
Além disso, empresas brasileiras que ofertam produtos e soluções para o setor elétrico também estão em busca de negócios no Canadá. É o caso da Brametal, a maior estação de testes das Américas e a maior fábrica de torres de telecomunicação e estruturas metálicas para geração, distribuição e transmissão de energia elétrica, com capacidade fabril de 200 mil toneladas por ano. “Já exportamos para 15 países, entre eles Estados Unidos, que reconhecem a qualidade dos nossos produtos”, orgulha-se Alexandre Schmidt, diretor comercial e de marketing.
A Brametal já tem 47 anos de existência e, no Brasil, tem clientes como as empresas da Eletrobras e as linhas de transmissão da hidrelétrica de Belo Monte, que, com mais de 2.500 quilômetros de extensão, utilizam as estruturas da Brametal. Recentemente, a empresa incorporou ao seu catálogo três novos produtos: torres treliçadas para aerogeradores, suportes para painéis fotovoltaicos e torres metálicas monotubulares, passando a atender também o mercado de energias renováveis.
Diversificação e eficiência energética podem caminhar juntas
Marcelo Figueiredo, chairman da canadense Progesys — empresa atuante na área de engenharia e gestão e que entrou no mercado sul-americano com a aquisição da brasileira Acttio —, ressalta que investir em eficiência energética não dispensa a adoção de fontes de energia sustentáveis. “As duas coisas são importantes e podem caminhar juntas. A questão é que os investimentos em outras fontes de energia ainda costumam ser altos e levam mais tempo para dar retorno, mas eles são imprescindíveis.”
Figueiredo observa que o investimento feito em eficiência energética pode ser atrelado a projetos futuros de diversificação energética. A troca de máquinas elétricas por modelos mais eficientes pode ser realizada por partes e planejada de tal forma que o retorno financeiro pode ser destinado à implantação de sistemas de energias renováveis, como a solar e eólica.
De acordo com o executivo, muitas empresas ainda não priorizam projetos de eficiência energética por falta de noção da dimensão e rapidez do retorno. “A simples troca de lâmpadas incandescentes por lâmpadas LED já pode gerar até 90% de economia. É investimento com retorno imediato, mas muitas empresas ainda não se atentam para detalhes como esse”, diz.