Investimento estrangeiro pode acabar com déficit histórico e promover crescimento econômico e social
Por Estela Cangerana
O novo marco legal do saneamento básico no Brasil, em discussão na Câmara dos Deputados, deve abrir definitivamente o caminho para empresas e fundos internacionais dispostos a investir em um negócio bilionário, aguardado por anos, e de enorme relevância para o desenvolvimento econômico e social do País. Isso se traduz em uma injeção de cerca de R$ 700 bilhões até o ano 2033, para tirar o Brasil da posição de 112º colocado entre 200 países no ranking do saneamento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
De acordo com declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, a expectativa é de que haja no exterior trilhões de dólares apenas aguardando a mudança regulatória para serem aportados no setor nos próximos anos. Os números brasileiros são impressionantes: 100 milhões de brasileiros (47,6% da população) não possuem coleta de esgoto e 35 milhões sequer tem acesso a água potável, segundo dados do Instituto Trata Brasil. Mais da metade do esgoto do País (55,5%) não é tratado.
Além dos evidentes benefícios sociais e ambientais, estima-se um importante impulso econômico a partir desse investimento. Não apenas pela imediata geração de emprego e renda com os projetos, mas também pela geração de melhores condições de desenvolvimento das comunidades atingidas no pós obras. Os impactos devem ser sentidos especialmente entre as populações feminina, negra e indígena, conforme levantamento feito pela BRK Ambiental, a maior empresa privada de saneamento no Brasil, controlada pela gestora canadense de recursos Brookfield Business Partners desde 2017 e uma das potenciais investidoras no setor. A companhia pretende investir mais R$ 7 bilhões no Brasil nos próximos cinco anos.
“O saneamento ainda é uma infraestrutura que está no século passado no Brasil. A falta dele é um fator de desigualdade de gênero e raça, que traz as mulheres como suas grandes vítimas”, afirmou a presidente da BRK, a engenheira Teresa Vernaglia, que participou recentemente de evento na CCBC sobre o assunto. Ela destacou estatísticas como, por exemplo, o afastamento de 8 milhões de mulheres por ano de suas atividades cotidianas apenas em decorrência de diarreias.
Meninas sem banheiro em casa têm um desempenho 25% menor no Enem que outros estudantes e as trabalhadoras na mesma condição ganham 73,2% a menos que as que possuem banheiro no lar. “O acesso a água e esgoto tiraria imediatamente 635 mil mulheres da pobreza, a maioria negras e jovens”, destacou a executiva.
“Em cinco a sete anos com investimento, a realidade de uma comunidade muda radicalmente”, disse, citando o caso da cidade de Uruguaiana, no estado do Rio Grande do Sul. A empresa iniciou os trabalhos no munícipio em 2011 e, de lá para cá, conseguiu elevar a cobertura de esgoto de 8% para 94% das casas. Entre outras coisas, isso resultou em uma drástica redução de 28 vezes nos casos de diarreias entre 2012 e 2018, que passaram de 3 mil para 106 por ano, de acordo com a Secretaria Municipal da Saúde.
Para cada R$ 1 investido em saneamento, economiza-se mais de R$ 4 em saúde pública. A votação do novo marco legal do setor (Projeto de Lei no 3261/19), que facilita a entrada de capital privado, está para acontecer no Plenário da Câmara neste mês de dezembro. Depois, o texto segue para a votação no Senado e espera-se a sanção do presidente Jair Bolsonaro ainda neste ano.